Análise Hertzberger

Gradações de demarcações territoriais:

O lugar depende de quem zela e de quem se sente responsável por ele. Se o poder público interfere muito, por meio de obras públicas e regulamentos, os cidadãos não se sentem à vontade para modificar o espaço. Assim, habitantes se tornam estranhos em seus próprios ambientes, gerando medo e desconhecimento. Esta falta de proximidade com o espaço, leva à um descaso e até à destruição da propriedade pública. Isto explica o fato de antes a rua ser considerada um local de união, contato social,  e depois, com o aumento do tráfego, do uso de entradas mais fechadas e de um maior individualismo, as ruas se tornaram um lugar inseguro e sem grandes interações sociais. No trajeto, é possível ver algumas pichações e lixos na calçada, que revelam um distanciamento e falta de responsabilidade  com o espaço.

O carácter público do espaço é temporariamente colocado de lado quando um indivíduo ou grupo têm a oportunidade de usar partes do espaço público para seus próprios interesses. O uso do espaço público por residentes, como se fosse

privado, fortalece a demarcação por parte do usuário desta área aos olhos dos outros.

Dependendo do grau de acesso, é possível determinar se um espaço é mais ou menos privado, comparado a outros ambientes. A demarcação territorial e as possibilidades de acesso são expressados pela articulação de forma, material luz e cor - isto aumenta a consciência dos moradores e visitantes. A escolha de motivos arquitetônicos , sua articulação, forma e material são determinados, em parte, pelo grau de acesso exigido por um espaço. Soleiras, parapeitos, entradas, alpendres são exemplos de tipologias de intervalo, onde as esferas privadas e públicas se superpõe, ao invés de estarem rigidamente demarcadas:

        No trajeto, é perceptível o uso de vidros transparentes em bancos, lojas e no palácio das artes. Este material proporciona ampla visibilidade para ambos os lados, o que produz uma sensação de acessibilidade. A escolha da grade ao invés do muro no parque municipal também expressa esta acessibilidade, uma vez que qualquer transeunte consegue enxergar o parque, mesmo fora dele. O uso de colunas faz com que a esquina continue funcionando como um espaço público, de forma que as pessoas conseguem atravessar a esquina por trás da coluna, como no caso do Cinema Cineac de Amsterdam. Também são utilizadas grades e paredes espessas com janelas que impedem a vista dos transeuntes, quando a intenção é demarcar um espaço restrito para a passagem ou entrada das pessoas.

        O edifício Maletta é um excelente exemplo para ser usado no mapa de diferenciação territorial. Nos dois primeiros andares, existem lojas, restaurantes e bares, sendo assim, acessível a qualquer indivíduo, os andares logo acima são escritórios, que possuem uma restrição de acesso maior e o restante é de residência, onde a restrição é ainda maior. A entrada dele é aberta a todos. Mas os elevadores, que dão para os andares residenciais e de escritório, são protegidos por uma grade, que separa o público da galeria do resto da estrutura do prédio. Neste caso, é explícito que os aspectos presentes na arquitetura demarcam áreas específicas, a quem se destina, e às distribuição de responsabilidades.




Público e privado:


  • Feira Hippie

Recebe cerca de 80 mil visitantes e emprega cerca de 30 mil pessoas.                                  

Serve como expressão da pluralidade.                                                                                   

O comércio é a razão mais importante para o intercâmbio social, é onde o produtor e consumidor conseguem manter um contato direto.                                                                           

É o espaço em que se torna possível o diálogo entre os participantes, já que possui um teor mais familiar e íntimo, e traz à tona um sentimento maior de conforto.                                                 

Relação do produtor com o consumidor é mais íntimo e amigável, concedendo um teor mais descontraído.

  • Pórtico

Lugar em que dois mundos se superpõem em vez de estarem rigidamente demarcados.        

Oferece conforto e abrigo do clima.                                                                                  

Senso de hospitalidade, já que consiste em uma oportunidade de acomodação.

  • Palácio das Artes

É acessível para o maior número de pessoas, mas não fica permanentemente aberto e possui algumas restrições.                                                                                              

Implica uma expansão fundamental do mundo público.                                                      

Fornece uma passagem direta para o parque.                                                                                    

Existe um espaço que conecta o interior com o exterior, funcionando como um intervalo (fronteiras entre o exterior e o interior são menos rígidas).                                             

Exemplo de atenuação da rígida divisão entre privado e público, já que o espaço é aberto para o público, mas existem ainda algumas atrações destinadas a uma plateia mais seletiva e restrita.

        Também é notório uma constante sobreposição dos espaços públicos e privados: algumas lojas começam a exibição de seus produtos já na própria rua e utilizam as músicas como uma forma convidativa para atrair clientes. Assim, a rua, por meio do comércio, favorece uma interação social.



Urdidura e Trama:


Na cidade, a urdidura, isto é, a divisão do espaço urbano em quarteirões delimitados dialoga diretamente com a trama que é a liberdade de uso das construções inseridas nesses espaços urbanos. Em sua definição teórica, a urdidura deve, em primeiro lugar, ser forte e possuir a tensão correta, mas depende da trama para ser decidida a cor, padrão e textura do tecido. Aplicando o conceito à arquitetura, nota-se que o planejamento espacial de uma cidade inicialmente não prevê qual uso exato será dado às áreas criadas com esse projeto de delimitação. Contudo, a imprevisibilidade é parte elementar da ideia de criação de uma aglomeração urbana. A estrutura coletiva é, portanto, a urdidura na qual as interpretações individuais são tecidas como a trama.

        Vale ressaltar também que isso se aplica ao uso dos espaços de forma não premeditada a partir das intervenções humanas com festas, feiras, manifestações e até mesmo ocupações quando as construções estão ociosas. No hipercentro de Belo Horizonte, esse último exemplo se apresenta na construção do antigo Othon Palace Hotel. O local, desocupado há algum tempo, tornou-se abrigo para moradores de rua, o que representou uma ressignificação da edificação - planejada para funcionar como moradia temporária, assumiu a função de lar definitivo.



Flexibilidade, Funcionalidade e Polifuncionalidade:

Hertzberger discute a questão da funcionalidade, flexibilidade e polivalência, segundo ele, funcionalidade vem da ideia da obra exercer uma função, mas afirma que um prédio com um grande enfoque em sua funcionalidade, tende a ser feita para aquilo, se tornando inútil para outras atividades, sendo então facilmente obsoleto, dada a sua baixa flexibilidade, que seria a capacidade da obra de se adaptar às mudanças do meio exigindo pouca ou nenhuma alteração, por fim, a polivalência remete à capacidade de exercer diferentes usos sem que ocorram alterações no todos para que isso ocorra.

        Dentro desses conceitos, muitos prédios do nosso trajeto do hipercentro se encaixam: como a Drogaria Araújo, que com sua flexibilidade, segundo Hertzberger comum em prédios mas antigos, manteve de certa forma sua identidade, alterando-se mais no interior, não sendo consumida pelas mudanças da cidade, e mantendo sua funcionalidade original, da mesma forma a direita o Museu da Moda, mantivera a linha de sua funcionalidade, não mais o Centro de Referência da Moda, mas mantendo essa linha e sua identidade visual.

Mais exemplos disso, o Automóvel Clube de Minas, o Palácio da Justiça e o Conservatório da Música UFMG, todos prédios que mantiveram sua identidade visual, em dois deles havendo porém alterações nas estruturas internas, exercendo funções similares as originais, mas com uma polivalência

O Palácio da Justiça, que apesar de ter sofrido reformas que afirmam ter o descaracterizado, manteve sua mesma função, mas agora abrigando também um museu. De modo também parecido, na parte inferior, o Conservatório da Música UFMG, que deixara de ser uma escola de música, tornando-se complexo cultural, restaurante e livraria




Forma convidativa:


Hertzberger no livro  define a forma convidativa como um modelo de espaço que busca mais afinidade com as pessoas a partir de ambientes que são adequados a cada situação, a fim de trazer uma expansão das possibilidades de uso e aplicações. O significado chave é maior potencial de acomodação, antecipando os desejos e deixando os usuários mais confortáveis. Um aspecto importante dessa forma é o cuidado com as dimensões corretas, ou seja, um espaço grande que vai poucas pessoas pode parecer não convidativo, ao mesmo tempo que um espaço pequeno que recebe pouca gente pode parecer repressivo.No percurso analisado, observa-se que as calçadas se encaixam nesse conceito, uma vez que por serem largas podem ser usadas para colocar mesas e cadeiras de bares e de lanchonetes, bem como food trucks.





Irregularidades:


Irregularidades é outro aspecto da forma convidativa. Hertzberger define esse conceito como articulação de espaços para explorá-las ao máximo e trazer maiores possibilidades de conexão, como o acréscimo de planos extras horizontais para ampliação de assentos e para colocar coisas. Isso leva a uma apropriação e contato espontâneo e informal das pessoas. No percurso percebe-se os corrimãos, já que podem ser usados para apoio e brinquedo de playground, os discos em volta das árvores, que podem ser usados como assento, colocar objetos ou realizar manobras de skate.





















































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